segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Congo, o preço da nossa passividade


Num post recente o Vitor fez uma breve menção às milhares de vidas brutalmente assasinadas no Congo, que não conseguem acordar o sentido de empatia do resto do Mundo.

Costuma-se dizer que a falta de intervenção militar externa se deve ao país alvo não deter riquezas estratégicas. A esperteza saloia costuma afirmar "Ah, mas se eles tivessem gás natural, a história era outra". Mas no caso do Congo, é precisamente o contrário. Parece que o território mais fértil do mundo e o solo mais rico está condenado a um feitiço macabro que perdura há séculos: primeiro com as atrocidades bárbaras cometidas pelo rei belga Leopoldo que criou o seu "Estado Livre do Congo", depois através do colonialismo belga, seguiu-se a crise desencadeada pelos movimentos nacionalistas e as suas guerrilhas internas, a ditadura de Mobutu, a 1ª e a 2ª Guerra do Congo, cujos confrontos ainda não terminaram. Contabilizam-se já 6 milhões de mortos, o que torna este conflito o mais sangrento desde a 2ª Guerra Mundial.

O Congo é o único país onde se assiste diariamente a um retrocesso em termos de conquistas humanas: seja nos direitos humanos seja nas condições materiais e de infra-estruturas. É o único país onde os avós podem dizer aos seus netos, que o Congo da sua juventude era mais desenvolvido que o actual. É um rewind assustador. Este site dos MSF pretende dar voz às pessoas do Leste do Congo, que assim deixam o seu testemunho sobre a guerra, a sobrevivência e o desejo de paz nesta região tão devastada pela violência, onde direitos humanos são um luxo do passado.

Quero apontar para algo que torna a violência do Congo tão sui generis: a utilização da violência sexual contra mulheres como arma de guerra e terror. Hillary Clinton apontou os holofotes mediáticos para esta chaga em 2009 quando visitou o Congo, e este ano Margot Wallström tomou posse enquanto representante especial da ONU para a violência sexual nos conflitos, mas uma reportagem do NY Times de hoje demonstra que ainda falta muito para chegarmos sequer perto de uma resolução.

A título de exemplo, na província do Kivu Sul, uma mulher é violada cada duas horas e as idades das vítimas variam entre os 2 e os 80. O Hospital Panzi em Bukavu presta um serviço essencial a vitimas de violações, fazendo 3600 operações gratuitas para reparar fístulas, que é uma condição causada por violações tão horríficas que as mulheres deixam de ter controlo da urina e das fezes. Mas o ginecologista chefe do serviço chega a desesperar porque o número de mulheres que regressam ao seu consultório é cada vez maior. Mas ele não desiste. Isso é o que o mundo faz.

Desliga-se a empatia com as vítimas destas barbaridades - mas porquê? Afasta-se o olhar do mundo porque é a vandalização de vaginas e porque é em África. É esta a triste e avalassadora realidade da matéria.

Qual é o meu desejo? Que a globalização não sirva só para termos um McDonalds em cada cidade do planeta, mas que antes sirva para positivamente acordar e abanar uma verdadeira consciencialização mundial sobre a dignidade humana que deve ser respeitada em todos os cantos do mundo.

RB

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